Para escrever sobre as cervejarias gaúchas precursoras da Cervejaria Continental é necessário que se faça de maneira a não deixar dúvidas, às vezes é necessário se escrever muito mais sobre a pessoa ou a família do que sobre cerveja e a cervejaria para não perder o fio da meada, A história dessas cervejarias e seus donos cervejeiros é complexa e envolve, inclusive, várias famílias e cervejeiros, tais como Ritter, Becker, Sassen, Bopp, Haerthel, Klinger, etc. e se entrelaçam de tal forma que é impossível falar da história de uma sem citar a outra ou outras, elas de uma forma ou de outra foram precursoras da cerveja gaúcha e terminaram por formar conjuntamente a Cervejaria Continental.
Nossa história começa em 1846 quando chega ao solo gaúcho o casal Ritter: Johann Heinrich Ritter II e Caroline Juliane Roth, que emigrou da Alemanha para o Brasil com seis filhos em 1846, originários da Aldeia de Kempfeld e arredores, situados no quadrilátero formado pelos rios Reno, Mosela, Sarre e Nahe, zona conhecida como Hunsrück. Dois filhos do casal imigrante, Philipp Ritter, casado com Catharina Kurtz e Karl Ritter, casado com Maria Elisabetha Schreiner, se mudaram para São Lourenço do Sul, na região sul do Estado, se dedicando à agricultura e a produção de cerveja.
Na região de Linha Nova, na época uma colônia (Picada Nova) que pertenceu inicialmente a São Leopoldo, depois a São Sebastião do Caí; mais tarde fez parte de Feliz e hoje é sede de município que integra o Vale do Caí, ficou um agricultor de 24 anos, nascido em 10 de março de 1822 em Kempfeld/Hunsrück, de nome Georg Heinrich Ritter e que durante a viagem de navio conheceu sua primeira esposa, Elisabeth Fuchs, nascida em 19 de janeiro de 1827 em Niederlinxweiler, Alemanha e que emigrava com seus pais e irmãos no mesmo navio.
Georg Heinrich Ritter, foi o indiscutível pioneiro da cervejaria do sul brasileiro, seus filhos e genros ampliaram o negócio e abriram cervejarias pelo estado do Rio Grande do Sul. Era oriundo da antiga Prússia tendo claros traços de personalidade germânica, austero e sincero, um ícone na sociedade de então, sendo temente a Deus e um esteio da comunidade luterana de Linha Nova tornou-se o patriarca de uma família que se destacaria na produção de cerveja no final do século XIX e início do século XX. Inicialmente, Georg dedicou-se à agricultura e, em algum tempo, abriu a primeira casa de comércio de Linha Nova, atendia às necessidades da população local comprando os produtos rurais dos colonos e vendendo mercadorias de primeira necessidade.
Em 1864, Georg Heinrich Ritter já era um homem muito próspero nos seus negócios e construiu um grande casarão que foi um dos primeiros da localidade e que até hoje existe, na cidade de Linha Nova, tendo sido reformado recentemente pela Prefeitura do Município. Ali funcionava a venda e um salão de bailes no andar térreo e a residência da família (especialmente os dormitórios), no andar superior.
Uma curiosidade, em 1868 veio o Pastor Heinrich Wilhelm Hunsche, diretamente da Alemanha para cá. Ele tinha que atender Linha Nova, Nova Petrópolis e São José do Hortêncio. No início ele morava em S.J. do Hortêncio. No ano seguinte, em 1869, o Pastor Hunsche achou melhor mudar-se para Linha Nova, no meio do caminho entre Nova Petrópolis e S.J. Hortêncio e como não tinha onde morar foi acolhido como hóspede ilustre na casa de Georg Heinrich Ritter, onde ficou morando por três anos, isto é até o ano de 1872. A escolha do Pastor Hunsche de ir morar em Linha Nova, por motivos óbvios, foi influenciada por Georg Heinrich Ritter, líder local, tesoureiro e Presidente da Comunidade Evangélica de Linha Nova.
E foi exatamente no porão do casarão, em 1868, que começou a funcionar a primeira cervejaria do Estado do Rio Grande do Sul criada pelo próprio Georg Heinrich Ritter que tinha várias habilidades, porém a mais notável era o conhecimento em fabricação de cerveja, pois aprendera as técnicas da profissão ainda jovem na Alsácia-Lorena, com seu tio materno Roth, que lá residia. Seguiu a Lei da Pureza, em vigor na Alemanha desde 1516: malte de cevada, lúpulo, fermento cervejeiro e água limpa, a cerveja Ritter fez muito sucesso. Nas primeiras décadas após a colonização era bastante comum ocorrerem reuniões de amigos, especialmente para os festejos dos Kerb (festa do padroeiro). E todas as novidades eram motivos de comentário e festa e assim os imigrantes, com grande euforia, comemoraram a implantação da pequena indústria familiar dos Ritter em Linha Nova.
Do primeiro casamento com Elisabeth Fuchs, tiveram nove filhos: Henrique, Carolina, Elizabeth, Carlos, Filipina, Jacó, Guilhermina, Catarina e Henriqueta. Sua esposa faleceu em 21 de junho de 1868, um ano após em 1869, Georg, tornou a casar-se com Maria Margaretha Konrad Ritter, cunhada e viúva de seu irmão Friedrich Georg Ritter, que tivera cinco filhos com o primeiro marido: Maria Christina, Elisabeth, Frederico Jacó, Susana Maria e Catharina, que faleceu aos seis anos de idade. Com esse segundo casamento nasceram mais dois: Phillip e Gustav, formando um grupo de quinze crianças e jovens na casa.
Em 1883, movido pela esperança na participação em uma fabulosa herança a que os componentes da família Fuchs (sua primeira esposa) teriam direito e pela saudade da pátria Georg Heinrich decidiu aos 61 anos voltar à Alemanha, com sua segunda esposa e seus quatro filhos ainda solteiros, passando a residir em Darmstadt. Mas a saudade de sua nova pátria, Brasil, foi maior que aquela da velha Alemanha e nem a esperança de uma futura herança conseguiu impedir que ele voltasse em menos de um ano depois de ter saído "de casa".
Em 13 de março de 1889, 3 dias após completar 67 anos, Georg Heinrich Ritter veio a falecer.
Um comentário:
Muito bom poder ver a história de nossos antepassados registrada tão bem e escrita de uma maneira excelente!!!
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